quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O Último Natal (O Nome do Sonho)

Especial de Natal do meu livro, O Nome do Sonho, que estou terminando de escrever.
Feliz Natal, Sonhadores. (:

A campainha soou às nove horas da noite. O céu estava estrelado por trás da janela e Anne aguardava ansiosa que ele chegasse, por isso ao ouvir o toque correu até a porta entusiasmada.

— Eu atendo, mamãe! – gritou antes de chegar até a entrada.

A casa estava quente e com um cheiro de comida delicioso. A mesa arrumada com uma toalha vermelha por baixo e outra de renda branca por cima. Copos e talheres bem organizados e guardanapos verdes dobrados em formato de pinheiro sobre os pratos.
Estavam apenas esperando Antony para começarem a ceia de Natal: tradição realizada todos os anos pela família Elpis.

— Feliz Natal, Vovô! – Anne cumprimentou abraçando o mais velho assim que abriu a porta.

Ele vinha sempre todo de vermelho e com um gorro natalino. Anne sabia que os presentes eram comprados pelos amigos e familiares, mas o avô insistia da vestimenta temática mesmo assim; outra tradição.

— Feliz Natal, querida. – respondeu acariciando os cabelos da neta. – Por que não me ajuda a levar os presentes para dentro?

Ele apontou para as sacolas com a mão e empurrou uma delas com o pé, piscando para a menina. Era um sinal que eles tinham, todo ano ele mostrava qual dos presentes era o dela e, escondida, Anne abria antes da ceia e sem autorização da mãe.
O presente nunca era o único, Antony acabava sempre entregando mais alguma coisa á ela depois de jantarem e brindarem o feriado. Helena reclamava dizendo que estava mimando a garota e depois entrega também alguns presentes à filha. Para Anne, era a melhor parte da noite.
O recém-chegado foi até a cozinha cumprimentar a filha e o genro enquanto, seguindo as instruções do avô, a criança pegou as sacolas apoiadas no chão e correu para deixá-las em baixo da árvore.
Sentou no tapete da sala e abriu o primeiro de seus presentes. Era uma varinha escura, acompanhada de um livro e um cartão prometendo que o avô fazia questão de ler para ela; um estímulo à suas fantasias em casa um dos itens.

— Anne, será que todo ano preciso dizer que a hora de abrir os presentes é depois da ceia? – Helena apareceu com uma bronca, mas o tom não era bravo. – Venha, a comida está na mesa.

O estômago da menina roncou assim que a mãe terminou a sentença e as duas riram abertamente. Aquela época do ano era sempre assim, cheia de tradições, risadas e alegrias.

Ao menos até aquele ano. O último que todos passariam juntos.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Hey There Delilah

 
Bom, primeiro, esse texto foi escrito para o Desafio de Final de Ano que a Mel fez o favor de montar pra gente. Então, quero agradecer a ela porque realmente foi um desafio escrever. Um conto com cena de sexo entre duas mulheres (sendo uma prostituta) não é meu estilo, mas foi uma delícia escrever. Aliás, sempre é um delícia escrever coisas diferentes.
Segundo, obrigada mana e dora, vocês ajudaram pra caramba! E terceiro, se você chegou até aqui já sabe que é um conto femme (lésbico) e com NC (cena de sexo), então não leia se não se sentir a vontade para tal.
Espero que gostem. (:

Andava de um lado para o outro na calçada, esperando seu cliente chegar e revezando o peso do corpo entre uma perna e outra, para aliviar a dor que o salto agulha causava. Vestia um espartilho preto que parecia de couro e uma saia do mesmo tom, porém de tecido mais leve. Por baixo da saia, uma meia calça arrastão, completando o visual totalmente clichê, mas ainda usado em sua profissão.
A cor da roupa combinava com a maquiagem carregada dos olhos, porém contrastava com o batom vermelho e a pele claríssima. Ria ao pensar como a descrição poderia parecer a de um conto de fadas. Lábios cor de sangue, pele branca como a neve. Uma descrição de contos de fada para uma vida completamente distante deles.
 Chamavam-na de Ninien, num sotaque inglês, fazendo-a sentir-se poderosa. Fora um cliente estrangeiro que inventara o apelido, explicando que era uma variação de um nome lendário, de uma poderosa bruxa das lendas de seu país de origem. Lembrava que o original era Vivianne, mas era comum demais, então acabou adotando o adaptado Ninien, achando que pelo menos no apelido poderia fingir ser incomum e elegante.
Mal sabia ela o quão realmente era incomum e elegante. A vida tentara desprezá-la, mas ainda assim era muito mais valorizada que a maioria de suas colegas de profissão. Seu chefe, Marcus, não a deixou nem uma semana na rua entregue aos clientes comuns, percebera seu potencial e a separara logo para os mais exigentes – e talvez mais depravados.
Seu corpo era maravilhoso. Seios fartos, coxas grossas e firmes. Gordura na medida certa, escondendo os ossos da costela e deixando um pouquinho salientes os do largo quadril. Era sempre parabenizada pela beleza, mas no fundo a odiava, sabendo que Marcus nunca a deixaria escapar de suas mãos. Era uma peça rara demais para ser perdida.
Uma peça. Como um vaso enfeitando a mesa de centro. Era apenas isso; um objeto aos clientes e um troféu ao chefe. Para si mesma, não era nada. Era proibida de existir como humana, incentivada a comportar-se como ferramenta, cumprindo seus objetivos. Entregando o prazer que pagavam para ter.
Todos a possuíam. Todos menos ela mesma.
Parou e deixou o corpo apoiar na parede ao lado da porta. Era proibida também de afastar-se da casa. Marcus dizia que para sua segurança, que as colegas de trabalho não gostariam de vê-la pelas calçadas, que roubaria seus clientes quando já tinha os próprios.
Na verdade, era instruída a esperar dentro da casa, mas não aguentava mais o ar pesado e grudento dela. Precisava encontrar o vento frio para acalmar-se. Precisava esfriar o corpo, congelar os pensamentos para aguentar mais uma noite.
Não sabia quem atenderia. Não costumava saber, a não ser quando eram os clientes fixos, com datas marcadas durante o ano todo. Sabia apenas que já estava atrasado.
Gostava mais dele por isso. Seu tempo seria o mesmo, não importava a hora que começassem. Era paga pela hora marcada, o atraso não era responsabilidade dela para ser descontado.
Ninien começou a tamborilar com os dedos na parede, impaciente. Apesar de não estar ansiosa pelo trabalho, odiava esperar. Dobrou um dos joelhos, apoiando o salto também na parede. Ouviu um carro se aproximando em velocidade e diminuindo aos passar por ela, não o suficiente para estacionar, mas apenas para admirá-la e buzinar já virando à esquina.
Suspirou irritada. Desprezava a espécie humana. Principalmente os homens, eram todos ridículos. Desde o estrangeiro que lhe apelidou até os piores clientes que conviveu enquanto atendia nas ruas.
Desprezava também a si mesma, uma prostituta de luxo, porém tão baixa quanto às rameiras das ruas.
Ouviu mais um carro se aproximando, dessa vez devagar. Virou na esquina quase parando e pisou no freio quando chegou até ela. Era um Audi conversível, num tom perolado. Devia ter pago uma fortuna para tê-la, ainda mais durante toda a madrugada.
 Endireitou o corpo e caminhou até o carro, mantendo a postura e cruzando as pernas na frente do corpo, acentuando o movimento do quadril. Tocou na porta e quase estancou ao ver o motorista.
Ou melhor. A motorista.
Pelo que conseguiu assimilar na noite, tinha o cabelo num tom loiro escuro, a pele clara, porém nem tanto quanto a própria. Corpo magricela, perceptível principalmente nos braços finos, que não eram cobertos pelo vestido de mangas curtas, num tom cor de rosa avermelhado.
Abriu a porta e sentou no banco, agradecendo por finalmente descansar os pés. A cliente nem chegou a virar o rosto, o cabelo estava preso de lado num emaranhado que o fazia cair ao lado da face, escondendo parte de suas feições.

— Coloque o cinto. – pediu com a voz trêmula, revelando certo nervosismo.

Ninien obedeceu ainda analisando a garota, estava acostumada a cumprir ordens, e apesar de na grande maioria dos casos os clientes serem homens, no final não importava o gênero. Assim que prendeu o cinto, a outra pisou no acelerador, deixando o ponto de encontro para trás.
Apesar de bagunçar o cabelo, gostou do vento batendo no rosto. Ajudava na tarefa de congelar a mente para exercer sua função. A primeira e última vez que esteve com uma mulher fora um fiasco, a cliente utilizou brinquedos um tanto sádicos. Nada que provocasse dores muito intensas, já experimentara vários outros depois daquilo, mas na época ainda estava começando como artigo de luxo. Nas ruas aqueles aparelhos não eram permitidos. A rua tinha regras, dependendo do preço.
Ela não. Pagavam bem demais para terem proibições.
A única regra era entregarem-na de volta com a mesma aparência que partira, no máximo alguns arranhões leves. Pronta para o dia seguinte. Mesmo que o dia seguinte fosse acompanhado de algumas dores. Marcus não se importava com seu bem estar, bastava que estivesse viva e bela.
O carro diminuiu, acordando Ninien de suas memórias. A insegurança precisava ser vencida o quanto antes. Se aprendera alguma coisa no tempo entre a última mulher e aquela, era que a insegurança apenas causava mais sofrimento. Os clientes ficavam intimidados quando aparentava ser poderosa, alguns até mesmo inseguros, atrapalhando a ereção nas noites de sorte.
Entraram numa portaria escura. Provavelmente mais um motel sofisticado, em que a privacidade e o sigilo eram essenciais. Os clientes mais ricos sempre a levavam para estabelecimentos daquele tipo.
A motorista apresentou algum cartão qualquer, o portão eletrônico se abriu deixando o carro atravessar para em seguida adentrar numa garagem privativa. A loira destravou o cinto antes de finalmente voltar o rosto para a prostituta, que distraída, continuara encarando-a durante toda a viagem.
Ela tinha os olhos negros e profundos, o rosto limpo, aparentemente sem maquiagem. Os lábios levemente ressecados, despertando um desejo que Ninien acreditava ser apenas devido à prática, de tocá-los e umidificá-los com a própria língua.
A meretriz percebeu seus atos e virou o rosto, estranhamente envergonhada. O coração acelerou quando notou a falta do vento para congelar seus pensamentos. Apertou os dedos, tentando esconder a insegurança.

— Marcus te apresentou como Ninien. Como não aprecio desigualdades, é melhor que saiba como me chamar também. – falou com a voz ainda mais nervosa que antes. – Delilah.
— É um prazer conhecê-la. – brincou com as palavras, deixando que o nervosismo da outra afastasse parte de sua insegurança.
— O prazer é todo meu. – respondeu tentando retribuir a brincadeira.

Delilah desceu do carro e deu a volta, abrindo a porta do carona, melhor que muitos cavalheiros. Não parecia ansiosa como a maioria dos que procuravam por profissionais do sexo. Ao contrário, parecia insegura com a decisão e inocente demais para pagar por prazer ou realização de desejos.
Esticou a mão à Ninien, que aceitou e saiu do carro. Agora que estavam sob a luz artificial, a loira deixou os olhos explorarem o corpo da outra sem mistério. Demorou-se nas pernas, mordendo um pouco os lábios enquanto o fazia, e passando mais rápido pela parte superior. Ignorou o rosto, já analisado no carro.
Ainda de mãos dadas, guiou a prostituta até o quarto, passando por uma escada estreita e adentrando pela porta entreaberta. O ambiente era claro e luxuoso. Uma cama de casal grande a alta, espelho cobrindo uma das paredes, com uma barra de pole dance no meio. Sem qualquer divisão, na parede em frente à cama estava uma banheira redonda, com espaço para no máximo três pessoas.
A imagem das duas refletida no espelho, de mãos dadas, formava uma dupla interessante. Ninien vestida de forma a mostrar grande parte do corpo, com o salto alto tornando sua postura elegante. Delilah com uma sandália branca sem salto, deixando-a ainda assim apenas um ou dois centímetros mais baixa, o vestido apenas um pouco acima dos joelhos, revelando apenas parte das pernas quase tão bonitas como a da companheira.

— Certo. – a de rosa começou, limpando a garganta. – Acho que você deve estar mais acostumada com isso do que eu.
— Não teria tanta certeza. – respondeu sincera.
— Bem, eu nunca paguei por isso. – admitiu.
— Nem eu. – riu.

Delilah riu também, acompanhando a outra. Não tinha certeza do que a levara até lá. Queria suprir o desejo de estar com outra mulher, mas sem revelar a vontade a qualquer uma de suas amigas. Estava quase desistindo dos homens, todos que conhecera foram desprezíveis demais, incluindo o último e quase atual namorado.

— Certo. – recomeçou. – Que tal se, apenas essa noite, você pudesse fingir que não é o que é?
— É o que vários costumam pedir.
— Não, mas não é o que quero dizer. Não para esquecer, mais como se pudesse trocar.
— Como assim?
— Você gostaria de fingir que é você quem está pagando por isso? Quero que esteja no controle, sabe melhor o que fazer do que eu. – admitiu mais uma vez.

Ninien ponderou surpresa, aquilo era novo. Já tinha lidado com vários fetiches e muitos clientes costumavam pedir que fosse natural, que fingisse estar com ele por vontade, não obrigação. Ela não esquecia quem era, mas aprendera a fingir bem.
Mas Delilah não estava pedindo fingimento. Estava dando-lhe a liberdade de escolher. De mandar e quem sabe simplesmente não fazer nada. Poderia aproveitar o motel e dormir tranquila, sem obrigações.
Contudo, a falta de dever desabrochou nela o próprio desejo. Pela primeira vez poderia ser ela mesma. Poderia possuir a outra como costumava ser possuída. Poderia ser a dona de alguém.
Adorou a ideia.
Mudou a expressão, soltou a mão da garota e rodeou-a, analisando de todos os lados, como costumava ser analisada. Parou de frente para ela, de costas para o espelho. Os lábios ressecados pareceram muito mais atraentes agora que estava no comando, deixando claro que o desejo anterior era mais que experiência. Era real.
Aproximou-se de Delilah, que afastou até ficar contra a parede. A respiração dela era ofegante, fazendo a outra finalmente entender que realmente tinha mais experiência. Estava claro que ela nunca esteve com outra mulher.
Sorriu com a ideia de ser a primeira para a loira. Mal a conhecia, mas não gostaria de compartilha-la com nenhuma outra. A ideia que era toda sua, como ela mesma nunca fora de ninguém, era incrivelmente estimulante.
Levantou os braços, dobrando-os e deixando que parte deles encostassem na parede, um de cada lado da menina. Sentiu a respiração nervosa em seu rosto quando ela expirava e o corpo perceptivelmente trêmulo. Delilah fechou os olhos e assustou-se ao, logo em seguida, receber um tapa no lado direito do rosto.

— Não deixei que fechasse os olhos, vadia. – falou ameaçadora.

A garota soltou um gritinho de dor e reabriu os olhos, a reação fora uma surpresa, mas por incrível que parecesse, não a amedrontou. O rosto ganhou um tom vermelho e a pele uma ardência suportável. A distância diminuiu ainda mais e Ninien finalmente tocou-lhe os lábios, primeiro com doçura, sentindo um gosto de cereja que provava a presença de um resquício de gloss transparente, que deveria ter secado em sua boca.
Em seguida, puxou-a pela cintura, apertando o corpo contra o seu, sentindo os ossos frágeis da coluna em seus dedos. O beijo tornando-se desesperado, possessivo.
Afastou-se dos lábios e desceu pelo pescoço, mordendo-a na nuca, produzindo um gemido baixinho. Deixou que a outra mão descesse até a barra do vestido cor de rosa, enfiando-se sob ele e chegando até a pele da garota, arranhando e apertando-lhe a coxa.
Subiu novamente o rosto, buscando os lábios e mordendo-os antes de encontrar novamente a língua, fazendo-a soltar um gemido mais alto que o anterior.
Apreciando a sensação, Ninien levou a mão da cintura até a nuca, enfiando os dedos entre os fios loiros, puxando-os para baixo, deixando o pescoço esticado e o rosto virado para cima, com os lábios livres.
A mão que antes apertava a coxa continuou até alcançar a lingerie, puxando-a para baixo para em seguida tocar-lhe a parte antes coberta. Sentindo a área estimulada, continuou explorando-a com o dedo.
O toque provocou em Delilah um arrepio pelo corpo, ela apertou as coxas, envergonhada. Soltou um grunhido nervoso ao contrair-se e sentir a outra ainda dentro de si, querendo afastar-se da mulher, porém ainda presa contra a parede. Não esperava que as atitudes dela fossem tão intensas ou que avançasse tão rápido. Não sabia como era a vida de uma prostituta. Vivia num mundo perfeito, afinal.
Mesmo Ninien não imaginava que o desejo seria tamanho. Não sabia o quanto o corpo de uma mulher poderia lhe dar prazer. Nem ao menos o que era prazer, fingia-o todas as noites, mas percebia agora que nunca tinha chegado a senti-lo de verdade.
Era incontrolável.
Precisava aguentar o prazer de tantos homens tantas vezes que não queria se controlar agora. Queria tê-la por completo, então não podia permitir que se envergonhasse ou lutasse contra aquilo. Delilah precisava se entregar, talvez até mais do que a prostituta costumava fazer.
Não queria obrigá-la, mas isso nunca fora motivo para que a respeitassem. Precisava demais da sua própria noite para respeitar a velocidade da outra sem receber nada em troca.

— Muito bem. – pontuou séria, soltando o pescoço da outra e permitindo que seus olhares se cruzassem. – Você pediu por isso, qual o problema agora?

A pergunta assustou. O tom era sério demais e Delilah finalmente entendeu onde estava se metendo. Ela lhe dera a liberdade, precisava seguir as próprias regras. Sentiu a mão da mulher se movimentando, massageando seu sexo e voltando à coxa. Suspirou aliviada.

— Você tem duas opções. Pode ter o que eu costumo ganhar ou um pouco mais, ambos com consequências. – sorriu, se divertindo com o controle da situação.

Sem esperar a resposta, Ninien explorou suas costas e peito com as mãos, devagar. Sentindo as curvas da cliente e ao mesmo tempo procurando o zíper que abria o vestido.

— Quais as consequências? – Delilah perguntou com a voz ainda mais trêmula que no começo.

A prostituta achou o zíper, ao lado esquerdo do tórax. Abriu-o devagar, observando a roupa alargando-se no corpo da outra. Engoliu em seco e voltou a encarar o rosto da menina. Baixou as mãos até a barra do vestido, deu um passo para trás e puxou-o para cima, revelando aos poucos o corpo seminu.

— Opção número um, você me dá o que eu quero e eu tento não retribuir a ponto de te envergonhar. – sorriu não tão gentil. – Opção número dois, você me dá mais do que eu quero – deixou o olhar vagar até o pole dance – e eu retribuo dando-lhe prazer no seu tempo.
— Opção número três, começamos com a opção número um e depois vamos para a dois.
— Talvez, se fizer tudo certo na número um, posso pensar em dar-lhe a três. – deixou o sorriso, dessa vez, demonstrar sua satisfação.

Não esperava, mas estava realmente apreciando a companhia da cliente. Mais do que o controle, estava gostando também da personalidade dela. Estava gostando de estar com uma mulher. Estava gostando de estar em específico com aquela mulher.
Baixou os olhos, escaneando suas curvas. Puxou-a pelo braço empurrando-a em direção à cama. Delilah nem tentou esconder a vergonha. O rosto corou, mas gostou de sentir seu toque direto na pele. Estava extremamente nervosa com a situação, mas já tivera mais prazer que com seu no momento ex-namorado.
Eles viviam indo e voltando, então já nem se incomodava em colocar o ex na frente, mas nunca sabia exatamente em que ponto estavam. Provavelmente, depois daquela noite, não teriam mais volta. Nem que ele quisesse, talvez estivesse na hora de entregar-se ao que realmente era e sentia.
Ninien retirou os saltos e deitou na cama, dobrando os joelhos e entreabrindo as pernas. Chamou a garota para si, puxando-a pelo braço, deixando o corpo pressionar o seu e beijando-a mais uma vez, com mais entrega que antes.
Mordeu-lhe os lábios com força, querendo ouvir seus gemidos. Delilah entregou-lhes e afastou-se, erguendo o corpo com uma expressão confusa.

— Opção número um, o objetivo é o meu prazer, não o seu. – explicou.

Passou as mãos pelo corpo da garota, ora arranhando, ora apertando cada parte dela, adorando a vermelhidão aumentando no rosto a cada apertão, demonstrando sua timidez. Chegou às costas e desabotoou o feixe do sutiã, deixando Delilah vestindo apenas uma peça da lingerie. Apalpou seus seios, beliscando os mamilos, provocando alguns gemidos ainda mais altos.
Continuou com as mãos até os ombros e empurrou-a para baixo, deixando a cabeça na altura de seu próprio sexo. Delilah entendeu o recado. Não o faria por obrigação, mas sim por vontade própria. Seguiria ordens, mas apenas as que também desejava cumprir.
Tomou a frente da situação. A prostituta ergueu o quadril e ela subiu a saia e arrancou-lhe a meia calça arrastão, sem se preocupar em mantê-la intacta. Era a única peça cobrindo seu sexo.
Apesar de ainda insegura, Delilah deixou que as mãos da outra guiassem seu rosto, o instinto lhe dizia o que fazer. Tocou seus lábios inferiores com o mesmo prazer que beijara seu rosto. Ninien deixou-a assumir o controle e auxiliou com os dedos, acariciando seu clitóris. Sentiu a língua da companheira explorando-a, penetrando-a. Sentiu também as mãos em suas coxas, mantendo-as abertas e apertando seus músculos com vontade.
Deixou os próprios gemidos escaparem, entregando-se pela primeira vez ao prazer verdadeiro. Sentindo seus desejos realizados, quase como se fossem seus sonhos. Afinal, sonhara em deixar de ser uma prostituta e, naquela noite, conseguira. Diferente do proposto, era mais que uma cliente, era uma mulher comum.
Estava ganhando para estar ali, mas descobrira algo que dinheiro nenhum poderia comprar. Descobrira o real significado do prazer. Descobrira quem e o que era. E, quem sabe, descobrira também o amor. Não entendia nada sobre o sentimento, mas para uma meretriz o amor não poderia ser muito mais que aquilo. Para ela, o amor não poderia ser muito mais que uma noite no controle, sendo nada mais que ela mesma. Sem máscaras.
Chegou ao ápice do prazer, deixando o corpo tremer e contrair-se. Puxou o rosto da garota de volta para cima, buscando seus lábios brilhantes e não mais ressecados. O gosto de sua boca era todo seu, em todos os sentidos.
Delilah retribuiu o beijo com ainda mais vontade que antes, a timidez dissipada. Compartilhavam um momento de descoberta mútua. Podia estar pagando pela companhia, mas tinha certeza que não era o dinheiro que causara tudo aquilo.
Ambas compartilhavam aquele momento com a mesma intensidade. Rica e pobre, garota e mulher, cliente e prostituta. Não se preocupavam com o sentimento, deixavam nascer uma paixão que não podia ser errada. Não era ruim, mas incrivelmente boa.
Era cheia de defeitos, mas ao mesmo tempo perfeita. Era a realização de desejos e sonhos. Era a descoberta e salvação de essências. Era um tempo, não perdido, mas compartilhado.
Afastaram os lábios, exaustas. Delilah deixou o corpo rolar para o lado, finalmente deitando na cama. Suspirou satisfeita, ainda que o objetivo não tenha sido o prazer dela.
Ninien, por sua vez, fechou os olhos, feliz. Relaxou as pernas e acompanhou a cliente no suspiro, porém o dela era apaixonado. Apaixonado pela garota que tinha lhe apresentado o prazer.
Os pensamentos, porém, começaram a voltar à mente e ela levantou-se nervosa.

— Já volto para realizarmos a opção número três. – explicou sorrindo, ao ver o olhar curioso de Delilah.

Precisava do ar para voltar a congelar os pensamentos. Aquela noite era a realização de um sonho. Naquela noite, os suspiros poderiam ser de amor. Mas como poderia voltar para a realidade e fingir um falso prazer depois de conhecê-lo de verdade?
Precisava congelar os pensamentos e, quem sabe, mantê-los presos ali, naquele quarto, para sempre.
Precisava congelar os pensamentos e mantê-los onde tudo era real.

sábado, 21 de junho de 2014

Tudo bem?


— Tudo bem?
— Sim. – respondeu rápido, rápido demais.
— Mesmo?
— Melhor parar no sim.

(silêncio)

— Quando paro pra pensar sobre isso, já não sei. Mas tá tudo bem, é só não perguntar.

(silêncio)

— Sério, to bem mesmo.
— Quem você tá tentando enganar?
— Você?
— Eu não.
— Talvez eu mesma.
— Talvez.
— Enfim, tudo bem?

sábado, 14 de junho de 2014

Coralões


Para o coisongo, porque você sempre ajuda a tapar os furos do meu coração.
Te amo. Sempre. ♥


A gente nasce com o coração inteiro, livre pra voar e cheio pra ficar sempre flutuando, preso pelas mãos como um balão daqueles que buscam sempre o céu.

No começo, eles são perfeitos, puros e ingênuos, acreditando que nada no mundo pode machucá-los. Acreditando que vão permanecer sempre imaculados e bem cuidados.

Ledo engano.

Logo mostramos nosso tesouro aos outros e em pouco tempo nos vemos com um coração todo machucado. Cheio de cicatrizes e furos tapados com duréx. Ele continua se esforçando pra voar, mas o ar vai escapando um pouco a cada furo, tornando-o murcho mesmo depois de remendado.

Alguns têm a sorte de achar uma boa alma que consiga gás para enchê-los de novo. Outros só o escondem para que ninguém veja o tesouro destruído. E alguns também tentam mantê-lo flutuando com o próprio ar, soprado direto dos pulmões.

Mas oxigênio não faz balão nenhum flutuar. E às vezes não conseguimos encontrar a fonte do gás antes de desistirmos e escondermos nosso coração.

Outras vezes, mesmo enchendo-o de todas as formas possíveis, mesmo produzindo sua própria fonte de gás, às vezes os machucados são tantos que nem duréx nem fita crepe conseguem repará-lo.

Às vezes o balão tem tantos furos que não podemos mais repará-lo. Às vezes a melhor solução é desistir, escondê-lo ou desistir de fazê-lo voar. Às vezes nosso coração murcha e a gente simplesmente não sabe mais como concertar ele sozinho.

Às vezes a gente cansa de acreditar que ele pode voar.

Às vezes a gente o deixa cair e cai junto, na realidade: coração não é balão. Coração não voa nem fura, ele só bombeia sangue – e até nisso chega uma hora que ele falha.


sexta-feira, 30 de maio de 2014

Tem horas que é preciso escrever

Conto postado anteriormente na Amora Literária. Passa lá (:

Tem horas que ler não adianta, é preciso mergulhar nas próprias sensações e colocar os pensamentos para fora.
É preciso livrar-se deles para sempre, jogá-los ao mundo e distribuí-los com os outros. Deixar uma parte dele em cada um, para que reste apenas um pedacinho em si mesmo.
Para isso, ler não adianta. Tem horas que é preciso escrever.
Ler pode ajudar. Fazer a mente vagar por outros mundos e até conhecer outras paixões – pegá-las emprestadas e fingir que são suas até o livro se fechar.
Entretanto, depois de distanciar-se das páginas, você continua com suas próprias paixões. Por isso, às vezes é preciso mais que livros.
Escrever, por outro lado, é colocar você mesmo em palavras. É misturar-se em cada fala, cada cena, cada personagem. Ser todos e ao mesmo tempo nenhum, para não revelar-se por inteiro – afinal, não teria graça se todos conseguissem te ver sem reconhecerem a si mesmos.
Escrever é destrinchar seus sentimentos, dividindo-os entre a mente de suas criações e completando-os com ilusões.
O resultado é você. Contudo, são vários tipos diferentes de você, e nenhum deles é completo. Assim, nenhum deles é realmente você, mas tudo aquilo junto... Ah, aquilo faz parte de quem você é.
Por isso, às vezes ler não é suficiente, tem horas que é preciso escrever. E aquele momento era um deles, então ela escrevia:

“Tem horas que ler não adianta...”

E o resto da história é você.

domingo, 2 de março de 2014

O Teorema de Katherine, John Green

“Namoros, no fim das contas, acabam de um só jeito: mal. Se você pensar bem, e Colin sempre fazia isso, todo relacionamento amoroso termina ou em (1) rompimento, (2) divórcio ou (3) morte.”

O Teorema de Katherine conta a história de Colin, um garoto prodígio super inteligente e fascinado por anagramas (♥) que só namora Katherines (por enquanto). Foram 19 até o começo do livro, e a XIX acaba de terminar com ele, como quase todas fizeram.
Colin sai em uma viagem de carro com seu melhor amigo, Hassan, buscando alguma aventura que o faça esquecer Katherine XIX e deixar a tristeza de lado. E preciso dizer que o Colin me cativou completamente. Um menino todo apaixonado e cheio de amor pra oferecer, e ao mesmo tempo um terminado* nato.

 “Chorar é algo a mais: é você mais as lágrimas. Mas o sentimento que Colin carregava era um macabro choro ao contrário. Era você menos alguma coisa.”

É durante essa viagem que os dois amigos acabam chegando a Gutshot – uma cidadezinha mantida por uma fábrica têxtil e cheia de pessoas simplórias e gentis – e conhecem Lindsey, que logo faz amizade com os dois e tem um papel importante na história.
Em Gutshot, Colin tem seu momento eureca e decide criar um teorema que prevê os relacionamentos, tentando estimar quando tempo um casal passaria junto e quem terminaria a relação. Teorema esse que, acreditava Colin, traria sua última Katherine de volta.

“A distância que separava Colin e seus óculos permitiu que ele percebesse qual era o problema: miopia. Ele tinha a vista curta. O futuro jazia à sua frente, inevitável mas invisível.”

Talvez toda essa história pareça apenas um romance bobo, mas acontece que Colin é incrível e John Green um escritor com uma narrativa gostosíssima. Assim sendo, as palavras vão fluindo de forma agradável e quando você percebe já está todo envolvido pelo livro.
 A obra não é nenhum drama mega chorante como A Culpa é das Estrelas, mas também tem suas qualidades e seus momentos especiais. Além disso, o casal principal também tem uma fala muito parecida com o “Ok? Ok.” do outro livro, mas nesse é apenas “Oi. Oi.”, o que pareceu um pouco engraçado e um pouco repetitivo para mim.

“Não acho que nossos pedaços perdidos caibam mais dentro da gente depois que eles se perdem.”

Mas no final vai além de um romance bobo e acaba com uma reflexão sobre o futuro e as oportunidades que temos na vida. E como às vezes nos prendemos no passado e deixamos as coisas boas passarem sem ao menos notar.
O Teorema de Katherine é leve. Não é incrível, mas é uma boa sugestão para aquele momento entediante ou para intervalo entre livros mais pesados (seja no tema ou no tamanho).

“Ele pensou na distância que há entre o que lembramos e o que aconteceu, na distância entre o que prevemos e o que vai acontecer. E no espaço criado por essa distância, Colin pensou, havia espaço suficiente para se reinventar... espaço suficiente para se tornar algo, que não um prodígio, para refazer sua história de um jeito melhor e diferente... (...) Havia espaço suficiente para ser qualquer pessoa – qualquer uma, exceto a que ele já fora, porque se tinha uma coisa que Colin havia aprendido em Gutshot, era que não se pode impedir o futuro de acontecer. E, pela primeira vez na diva, Colin sorriu pensando no futuro infinito que se descortinava à sua frente.”


* Terminado é o termo que Colin inventa para designar aquele que tem seu relacionamento terminado. O contrário de Terminante, que é quem termina. 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Diálogo

Um dia me disseram que texto que vem assim sem querer não deve ser editado porque perde o sentido.

Esse é daqueles que vem quando a gente deita pra dormir e pensa.
E não largam enquanto a gente não levanta e grava.
E deixam quando a gente deita pra pensar e dorme.
Porque quando a gente deita pra pensar, a gente edita.
E quando a gente edita deixa o sentido dele existir de lado.

Esse é pra Raíssa Andrade, porque se não fosse por ela eu ia editar e ele não ia existir mais.


— Você me ama?

— Eu amo a ideia de te amar e de você me amar de volta. Mas se eu te amo e se você me ama de volta? Isso é outra história.

— Eu acho que te amo de volta.

— E mesmo assim não quer assumir seu amor?

— Não.

— Por quê?

— Tenho medo de você não me amar primeiro.

— Então que tal a gente descobrir se a ideia é verdadeira enquanto a gente permanece sem ficar?

— Mas ficar é permanecer.

— Então a gente fica no sentido literal.

— Acho bom. A literatura sempre foi nossa mesmo.

— Então a gente fica no sentido literal, até sair do livro e virar real.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

A garota das palavras




You speak in words without a sentence
You're the ghost that haunts me without a presence
(Gabrielle Aplin – Let me in)


A garota mantinha-se no canto, apenas observando, com a folha ainda em branco descansando sobre suas pernas cruzadas. O chão duro nunca fora um desconforto para ela, o único problema eram as palavras e pensamentos que não conseguia transcrever para o papel.

Palavras. Achava que sempre tivera dificuldade com elas, mesmo quando todos diziam o quão bem ela conseguia manipulá-las. Manipulá-las, pensava ela, como era um absurdo alguém supor que palavras poderiam ser manipuladas. Elas apenas eram, por conta própria e numa vontade completamente desprovida de sentido. Elas apenas surgiam de lugar nenhum para acabarem em lugar algum.

Mas ela queria que deixassem lugar algum e terminassem em algum lugar. Queria escrever uma história encantada sobre criaturas mágicas pairando sobre sonhos reais. Queria desenvolver as ideias que já vagavam em sua mente e, ao mesmo tempo, teimava em deixar as velhas de lado e agarrar-se àquelas novas que nem existiam ainda. Talvez apenas quisesse entender o que queria.

Talvez só precisasse colocar todos aqueles talvezes no papel em branco e deixar-se mergulhar naquela história ainda sem enredo sobre as criaturas fantásticas. Talvez estivesse mais uma vez cansada do tão intenso talvez. Talvez devesse apagar a palavra talvez do dicionário de uma vez.

-

Ele fingia esconder seus pensamentos nos livros enquanto imaginava o que tanto a garota divagava. Os olhos dela estavam sempre acompanhando-o para onde fosse, mas sabia bem que na verdade não o notava com nitidez. Era mais como se estivesse num canto da visão periférica: podia ser constatado, mas não focalizado, e menos ainda entendido. E menos ainda compreendido.

Ele sim a observava. Percebia-a com uma clareza quase absurda. Sabia muito bem que logo a mão começaria a se mover, riscando palavras que nunca pode ler. Palavras que tanto queria ler.

O que não sabia era que na verdade a mão dela não riscava palavra alguma. Que na verdade era sim observado, notado, focalizado e todo o resto. O que não sabia era que ela só continuava lá no chão duro para vê-lo em meio aos devaneios.

-

A garota levou a caneta até o papel e começou a rabiscar o que ele achava serem palavras. Baixou um pouco o rosto, mas manteve as pálpebras bem abertas, analisando a imagem que passava dos olhos para os dedos.

Por mais que a descrevessem até mesmo como escritora, para aquelas folhas em branco preferia sempre as imagens. Tentara com palavras, mas elas pareciam sempre soltas em frases ainda mais soltas. Elas nunca foram capazes de transcrever a realidade desenhada em sua frente.

Eram queridas, as palavras, mas elas não poderiam descrevê-lo. Na verdade nem o desenho podia, mas através dos traços podia prestar atenção nos detalhes e na visão que era apenas dela.